Crítica: "Família" era o álbum que Camila Cabello precisava
Os dias de "Havana" finalmente ficaram para trás — ou quase isso. Na última sexta-feira (8), Camila Cabello lançou o seu 3º álbum, "Familia". Depois de muita expectativa, incluindo os singles lançados anteriormente, como o feat. com Ed Sheeran, "Bam Bam", a cantora entregou o seu comeback no mundo da música. Mas o álbum foi suficiente para Cabello superar o hit (já antigo, de 2018) sobre a capital cubana? Por aqui, acreditamos que sim!
E não é só a gente que acha isso. O veículo The Guardian publicou uma boa crítica — com algumas ofensas disfarçadas —, na qual elogiaram o trabalho de Camila. "Ela finalmente mostra o seu potencial", escreve o jornalista, que chegou a resumi-la como ex-namorada de Shawn Mendes. O artista e o relacionamento finado entram em pauta, mas fiquem tranquiles, porque você sabe que o Telas nunca cometeria o erro de reduzir Cabello à existência de um homem.
Confira nossa crítica completa de "Familia", faixa por faixa!
"Familia" + "Celia"
Caso o nome do álbum em espanhol e o primeiro single, "Don't Go Yet", não tenham deixado claro: Camila se entregou de vez ao pop latino. A cantora, nascida em Cuba, moradora do México e depois naturalizada estadunidense, tem referências musicais de sobra e viu o sucesso que já vez quando se jogou no estilo. Ela até tentou repetir a dose com "Romance" (2019), seu 2º disco, mas o ritmo era muito mais para lá (Estados Unidos) do que para cá (América Latina) e acabou se perdendo.
Por isso, não havia forma melhor de abrir "Familia" do que a combinação da abertura instrumental de 17 segundos, que leva o nome do álbum, e "Celia" — faixa totalmente em espanhol, que fala de um homem que vivia uma vida "sem açúcar" e se apaixona por uma cubana quente, cheia de vontade de viver.
"pshychofreak"
O que falar sobre o feat. com Willow Smith? Muita coisa. Primeiro, a participação da cantora é muito bem-vinda, trazendo um vocal potente e grave no refrão, diferente do que Camila entrega ao longo do álbum. Mas a letra também merece uma análise a parte! Qualquer pessoa que lida com questões envolvendo sua saúde mental — como é o caso de Camila — vai entender perfeitamente o que as cantoras querem dizer. Na composição, elas falam sobre se sentir uma pessoa maluca, que não pertence ao planeta Terra. "Eu queria ser como todo mundo", cantam no refrão.
"pshychofreak", que é uma das únicas músicas do álbum que não leva a letra maiúscula no nome, também canta sobre a vontade desesperadora de sair de um local, como cinemas ou restaurantes, e de ver a sua vida amorosa sendo prejudicada pela sua ansiedade. "Quando a gente faz amor, eu quero estar lá", afirma Cabello. Para completar a composição bem íntima, Camila até entra na temática de Fifth Harmony e o término abrupto com o girlgroup em 2016: "Eu não culpo as meninas pela forma que as coisas aconteceram". Apesar de ser breve, é uma das primeiras vezes que a cubana fala sobre o assunto.
"Bam Bam"
Temos um feat. seguido do outro com "Bam Bam", parceria com o britânico (e ídolo de Camila), Ed Sheeran. A faixa, como falamos, já tinha sido revelada, com direito a clipe e apresentação em festival. Nesse momento, o nome de Shawn Mendes começa a vir à tona de forma evidente. A música é claramente sobre o término do casal, que foi comunicado ao público em novembro de 2021.
A letra fala sobre ressurgir das cinzas após uma decepção e "continuar dançando". Em um momento, ela até canta sobre prometer amor eterno a alguém e, depois, se ver vendendo a casa que compraram juntos. É uma música animada, que também traz a vibe latina de forma clara. Dá vontade de dançar e o clipe é divertido, mas não chega perto do MV de "psychofreak" e de outras músicas do álbum.
"La Buena Vida"
Na minha humilde opinião, "La Buena Vida" é uma das melhores do álbum. Camila apresentou a faixa, como quem não quer nada, em seu show para o Tiny Desk em outubro do ano passado e chegou a trazer uma banda de mariachis — que também marcam presença na faixa original. Porém a música não ganhou clipe, nem se tornou single (por enquanto). Só que ela é simplesmente tudo! A combinação perfeita do pop americano, com letra em inglês, antes de se jogar completamente nos ritmos latinos, mais tradicionais.
Outro ponto que vale atenção novamente é a letra. Cabello fala sobre como é chato viver em um relacionamento em que o outro só trabalha e está sempre tenso, sem priorizar as partes leves da vida — "Eu te entendo, mas a vida é agora, você tende a se esquecer. Olhando para trás, você vai se arrepender", canta a artista. Com certeza foi uma boa prévia do término que veríamos no mês seguinte.
"Quiet"
"Quiet" é outra música que aborda saúde mental — tema recorrente em "Familia", como você vai perceber. Nesse caso, a cantora fala sobre tudo o que pensa diariamente e os medos que tem em relação a sua vida amorosa, mas destaca que quando ela está junto da pessoa, tudo fica quieto. Ou seja, como o namorado (no masculino, porque ela fala explicitamente sobre ser um menino) a ajuda a manter a paz e tranquilidade em momentos difíceis. Não é ruim, mas está longe de ser um destaque do álbum. Poderia facilmente ser uma música de "Romance" ou até do disco de estreia de Camila.
"Boys Don't Cry"
Anitta, corre aqui! Sim, Camila deu o azar de lançar — em um curto período de tempo — música com o mesmo nome do hit da brasileira. Mas tudo bem, porque nenhuma das duas faixas é exatamente memorável. Dou mais destaque até mesmo para a "versão" de Cabello. "Boys Don't Cry" também fala de ansiedade, porém com outro ponto de vista. Na letra, a compositora fala com o namorado, pedindo para que ele não a afaste durante as crises dele. Outra que deve ser sobre o ex-relacionamento, porque Shawn também é bem aberto sobre seu transtorno de ansiedade.
Camila consegue falar do assunto de forma leve, misturando ritmos, passando de um trecho mais falado — quase como Rap — para refrão melódico e romântico, com direito a trecho acompanhado por coral. No resultado final, por incrível que pareça, não fica confuso e acaba sendo uma boa mistura de tudo o que "Familia" busca trazer.
"Hasta Los Dientes"
Outra que está no meu Top 3 do álbum! Para a canção, Camila convida Maria Becerra, cantora argentina, para uma faixa animada, que dá vontade de gritar bem alto em um show (Oi, Rock in Rio). Outro diferencial de "Hasta Los Dientes" é que Cabello está mais empoderada, falando sobre uma crise de ciúme. "Não quero te dividir, quero você só para mim". É um ótimo respiro depois de tantas músicas com lamentos, culpas desnecessárias e aflições. Elas basicamente dizem: "É isso mesmo, estou sentindo isso e só lamento". Se pudesse alterar algo em "Familia", seria inserir pelo menos mais uma música desse estilo.
"No Doubt"
Mais uma música sobre relacionamento e ansiedade. Falando assim, pode parecer repetitivo, só que "No Doubt" traz uma sonoridade bem diferente, dançante, que vai até mesmo contra o que grande parte da letra fala. No refrão, Camila explica que o jeito que o rapaz a beija, a deixa sem dúvidas do amor dele — "tira a loucura do meu cérebro". Por isso, faz sentido ser um ritmo mais divertido, mas ao longo da música, ela fala sobre ser hipervigilente e estar sempre à espera de algo horrível, que irá estragar essa sua felicidade. No começo achei só legal, mas quanto mais ouço, mais me apego ao estilo e à sinceridade da letra. Sem contar que músicas que te fazem refletir, enquanto te dão vontade de sair dançando são sempre interessantes.
"Don't Go Yet"
"Don't Go Yet" foi responsável por nos introduzir à nova era musical de Camila Cabello, em julho do ano passado. Com letra quase integralmente em inglês, ritmo latino que está em alta, clipe colorido e dancinha que cabe bem no TikTok, é a receita perfeita para um single, mas também está longe de representar tudo o que o álbum traz. O que eu gosto é que, mais uma vez, vemos uma mulher empoderada. Ela está toda arrumada para impressionar o boy e ele diz que precisa ir embora no começo da noite. Assim, a cantora já manda: "querido, não coloquei esse vestido à toa". Quem nunca? Teve gente achando que já era um sinal de que o relacionamento com Shawn poderia estar passando por problemas — mas não tem como saber, de fato, se a música é sobre o rapaz ou mera ficção.
"Lola"
O feat. com o cantor cubano Yotuel abraça um ritmo latino ainda mais clássico, que você ouviria em cenas de filmes de época, nos bailes de tango. Instrumentos de sopro tem mais destaque, o ritmo é bem marcado, além de outras estratégias que deixam a referência em evidência. O rapper de Yotuel dá um ar mais moderno, que é bem-vindo, mas não necessário.
Diferente de outras músicas do álbum, "Lola" investe em um storytelling mais rebuscado. A letra fala sobre uma jovem muito habilidosa, que poderia ir até a Lua, porém, não tinha dinheiro, teve uma vida humilde e todo o seu potencial foi perdido. Camila também fala que Lola está bem atenta à violência da polícia, que desaparece com os "rebeldes". Por isso, a personagem prefere ficar quieta. Poderia ser uma descrição do capitalismo, mas é uma crítica ao sistema socialista em Cuba. Camila tem uma visão bem presente nos Estados Unidos sobre o que rola em seu país de origem. Mas com certeza a canção ganha importância após os crescentes protestos dos jovens contra a repressão e censura, lá na América Central.
(Em um momento ela até canta: "Esse não é o sonho que nos venderam". Como isso não é um relato de imigrantes nos EUA? Encaixa perfeitamente, mas acho que não é o caso. Agora parei, mesmo).
"everyone at this party"
Enquanto "Bam Bam" traz uma visão mais divertida da vida pós-término, olhando o lado positivo das coisas, "everyone at this party" é o fundo do poço, a fase da depressão. A melodia é a mais triste do álbum, deixando isso bem evidente na faixa desde o começo. É diferente do resto de "Familia", sendo aquela cota de coração partido necessária (e a outra com o título escrito em caixa baixa, ao lado de "psychofreak").
"Você conseguiu o espaço que precisava? Você percebeu que não precisa de mim?" — é aquela música que qualquer um sente a dor, mesmo quem está em um relacionamento feliz e saudável. Parece que você acabou de terminar, sabe? Me arrisco a dizer que foi uma das últimas músicas que Camila gravou (não encontrei entrevistas que comprovassem minha teoria). Apesar de amar a faixa, acho que ela pecou em ser deixada por último, terminando "Familia" com um ar cabisbaixo, que não combina com a era.
Mas, de resto, não temos dúvidas de que Cabello entregou tudo o que esperavam dela e pode finalmente provar o seu potencial como artista pop! Os fãs que estavam aqui desde "Crying In The Club" estão orgulhosos!
Ouça "Familia" de Camila Cabello e tire as suas próprias conclusões!
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